Por: José Roberto Ferro – Presidente Lean Institute Brasil
Palestrei recentemente em um evento sobre “Manufatura e Logística no
Setor Automotivo”. Na sessão de perguntas, fui indagado sobre a relação da padronização
com o desenvolvimento de produtos e inovação.
Ainda continua forte nas mentes dos gestores, mesmo em empresas
avançadas em lean, a visão de que a padronização poderia engessar a empresa
quando se requer cada vez mais velocidade e agilidade.
Minha resposta é exatamente o contrário. Nesse cenário, a padronização
é ainda mais importante.
O trabalho padronizado é um dos elementos fundamentais do sistema
lean. Disseminado no ambiente de manufatura, ajuda a reduzir a variação,
melhora a qualidade e a produtividade, diminui o estresse e incrementa as
condições de segurança e ergonomia.
Nos ambientes administrativos, o trabalho padronizado também pode ter
esse mesmo impacto. Deveria ser uma das ferramentas essenciais para eliminar os
desperdícios e agregar valor aos clientes na medida em que se consegue definir
claramente a sequência, os tempos, os métodos e o desempenho esperado de cada
atividade.
Mas por que ainda é tão difícil implementá-lo? Por que há tantos
obstáculos e barreiras nos esforços de padronização do trabalho e dos processos
administrativos? Há muitos motivos concretos que geram essas dificuldades.
Na maior parte dos ambientes de trabalho nos escritórios, a definição
do trabalho e das atividades tende a ser deixada livre para as pessoas que executam
o trabalho decidirem. As tentativas de abrir essas “caixas pretas” e de definir
melhor o que é feito e como é feito encontra uma resistência natural,
substanciada em frases como “no escritório, não dá para padronizar porque as
coisas são imprevisíveis” ou “a demanda varia muito” ou, ainda, “a cada dia as
necessidades são diferentes”.
Outros fatores se referem à própria escolarização do pessoal
administrativo que parece ainda crer que os esforços de padronização podem
levar a uma robotização e desqualificação do seu trabalho.
Nos ambientes de escritório, as pessoas freqüentemente desempenham
múltiplas tarefas. Mas isso não impede a padronização. Ao contrário, facilita a
gestão, pois permite uma melhor flexibilidade na utilização das pessoas à
medida que os métodos são padronizados e visuais, podendo ser aprendidos mais
facilmente.
Assim, quase sempre, os processos administrativos possuem um
planejamento mal-definido (como são definidas as prioridades? quais são os
tempos?) e uma falta de controle, coordenação e sincronização entre as tarefas
e os fluxos que percorrem as diferentes áreas, funções ou departamentos.
Quais outras ferramentas ajudam o trabalho padronizado nos
escritórios? Vamos destacar algumas das mais importantes:
- O mapeamento do fluxo de valor administrativo é
essencial para enxergar os macros processos, evitando que se utilize a
padronização de forma isolada, separada do contexto e sem uma visão ampla das
necessidades do negócio, da demanda, dos clientes, das etapas e das conexões.
- A definição clara da cadeia de ajuda, em que se explicitam
os diferentes papeis e níveis de responsabilidade e de apoio, diferente da
estrutura hierárquica tradicional.
- E, junto com a cadeia de ajuda, o Jidoka, para
garantir a qualidade na fonte em cada etapa do fluxo administrativo e evitar
erros, retrabalhos e entregas incompletas.
- A gestão visual vai permitir que se saiba se
estamos adiantados ou atrasados e pode acionar a cadeia de ajuda e a solução de
problemas.
- A padronização dos acordos sobre o nível de
serviços é fundamental para definir as expectativas de desempenho e para
garantir fluxos administrativos contínuos e com qualidade, principalmente nas
fronteiras de departamentos ou áreas, de modo a aumentar o “completo e
correto”.
- O plano para cada processo administrativo vai
permitir um melhor planejamento, programação e controle, evitando as flutuações
e esperas.
- O fluxo e nivelamento, para facilitar a
coordenação e permitir a melhor utilização dos recursos, reduzindo esperas e
melhorando a sincronização.
No desafio de transformar os processos administrativos nos escritórios
das áreas de vendas, compras, finanças, TI, desenvolvimento de produtos,
engenharia, recursos humanos, assistência técnica e serviços de apoio aos
clientes, entre outras, a padronização nos ambientes administrativos vai
permitir que efetivamente os processos de melhoria contínua sejam
implementados.
Assim, as pessoas poderão utilizar amplamente sua criatividade, tempo
e conhecimento para fazerem suas atividades de maneiras inovadoras, livres do
desafio de terem que sempre encontrar formas diferentes de fazer a mesma coisa.
Essas dificuldades encontradas até hoje têm limitado a expansão da
padronização na área de serviços e nos ambientes administrativos. Mas cremos
que cada vez mais haverá uma disseminação crescente nesses ambientes na medida
em que vamos superando um a um esses obstáculos.
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